08/08/2017

Itamar Conzatti

Um Chevette 76 transformou a vida de Itamar

Um Chevette 76 transformou a vida de Itamar
Itamar Conzatti, 55 anos, um dos ídolos do Lajeadense, ingressou no futebol profissional com a oferta de um carro e marcou história no clube
O rapaz que se criou na barranca do rio e só queria pescar e jogar pelada com a gurizada no meio da rua se tornou um dos goleadores e ídolos do Lajeadense no fim da década de 1970. Itamar Conzatti, 55 anos, segue jogando em times master e em clubes de Lajeado nos fins de semana e guarda toda sua história nos campos de futebol em um álbum cheio de recortes de jornais.
A história do craque é surpreendente e inesperada. Sem qualquer trabalho de base, foi visto por um membro da diretoria do Lajeadense e convidado para jogar.
Conzatti descreve que, em 1979, completou 18 anos e foi para o Exército, ficou uma semana e retornou a Lajeado. Nessa época, trabalhava na empresa Olvebra e jogava futebol de salão e campo por toda a região por diversão. Um dia, um dos membros da diretoria do Alviazul e amigo de seu pai o procurou e, de forma informal, perguntou o que o jovem queria para disputar a Segunda Divisão do Campeonato Gaúcho como atleta do clube. “Eu nunca pensei em jogar profissionalmente. Cheguei a fazer um teste no Grêmio e, em 15 minutos, nem encostei na bola. Então, já tinha desistido do profissionalismo.” Seu futebol se resumia ao campeonato amador como jogador do Cruzeirinho de Teutônia.
Mas o empresário Delemar Dickel insistiu no pedido por vários dias para que ele pensasse em uma proposta. Conzatti seguiu não levando a sério a investida e manteve seu emprego na fábrica. Lembra que, dias depois, conversando com sua mãe, disse brincando que se o Lajeadense lhe desse um carro, até jogaria profissionalmente para eles.
O que nunca imaginou era que Dickel o procuraria novamente e, desta vez, em sua casa. “Eu disse a ele que não tinha pensado em proposta, mas minha mãe ouviu a conversa e disse que eu queria um carro”, conta rindo. Envergonhado, confirmou o que a mãe havia revelado indiscretamente. “Estava com muita vergonha de fazer uma proposta dessas, porque, como me dariam um carro se nunca me viram jogando no time e muito menos sabiam se eu ia dar certo.” Mas, para a surpresa da família, o empresário levou a proposta para a diretoria e, no dia seguinte, uma comitiva do clube foi até a casa dele e lhe deu um Chevette 1976, seminovo - na época, um carro da moda.
“Nem eu apostava em mim, e eles me valorizam e apostaram. E ainda exigi continuar trabalhando na Olvebra, porque era uma garantia que tinha.” Ele trabalhava das 6h às 14h e, depois, treinava.
O ano do Lajeadense
Depois de assinar o contrato, ganhou o carro, mas, mesmo assim, sua prioridade na vida ainda não era o futebol. Ele conta que no primeiro jogo em que deveria atuar, em Santa Cruz do Sul, acabou faltando. O treinador da época, Chaveco, queria levar o atleta para a disputa, mas ele tinha uma namoradinha em Teutônia. “Em vez de ir para o jogo, eu me mandei pra casa da menina no fim de semana e ninguém me achava.”
Na semana seguinte, estreou contra o time Mundo Novo, e o Lajeadense venceu por 3 a 0. Seu amor pelo futebol profissional já fazia diferença na sua vida. Na partida seguinte, descobriu a sensação de fazer gols em jogos oficiais e não parou mais. O duelo era com o São José de Porto Alegre. Fez três gols no confronto. Naquele ano, o Lajeadense ficou campeão da Segunda Divisão. Itamar foi o artilheiro, com 29 tentos na temporada, e fez, inclusive, o gol do título.
Em 1980, Itamar disputou o seu primeiro Gauchão e começou a sua trajetória no futebol. No fim daquele ano, parou de trabalhar na fábrica porque se profissionalizou como jogador de futebol.
Partida para outros times
No fim do ano de 1981, ele casou e foi vendido para o São Paulo de Rio Grande. Lá permaneceu três anos e foi campeão do interior. Depois, jogou no Brasil de Pelotas, no São Borja e no Chapecoense.
Em 1986, o São Borja comprou o jogador e, segundo ele, foi um ano excelente, com os melhores treinadores que ele conheceu. Um deles era Carlos Fröner (falecido). Com o time, ficou vice-campeão em Santa Catarina.
Depois, jogou novamente no Chapecoense. Foi para o Blumenau e para o Araranguá, e nos dois times foi campeão da Copa Santa Catarina e, assim, permaneceu no Estado catarinense até 1994. Teve uma rápida passagem pelo Figueirense.
No fim de 1994, com 34 anos, voltou para o Alviazul, onde jogou mais alguns meses e encerrou sua carreira.
Como encerrou a carreira
Em um sábado à tarde, depois de uma reunião, decidiu parar. Anunciou o fim de sua carreira no programa de rádio Bola na Mesa. “Acho que parei cedo, poderia ter continuado, mas o futebol é bom e bonito para quem olha de fora. Eu cheguei ao meu limite. Aprendi muita coisa, mas ele não é bonito para quem está dentro do vestiário. La existe muita podridão e muita traição.”
Com o encerramento de sua carreira, diz que começou na fase mais bonita da vida profissional - jogar o futebol amador. “Conheci pessoas do interior que me valorizam por cada jogada que eu fazia, que eram pessoas com quem eu me encaixava melhor. Depois do jogo, tu sentava (sic) na mesa, tomava uma cerveja e comia um pastel bem tranquilo, sem pressão.” Ele conta que, nesse meio, as pessoas são mais humildes e que, inclusive, um dia, um torcedor de um dos times queria dar um porco para ele como presente.
Conzatti começou no amador logo que anunciou o fim da carreira no estúdio da rádio. O presidente do Juventude do Bairro Conventos estava na emissora naquele dia e ouviu sua entrevista e, nos bastidores, já o contratou. “O que eu ganhava até eu achava muito. Depois dos jogos, me sentia mal pelo que me pagavam.”
Depois disso, jogou em muitos times pelo futebol amador. Passou por times de Lajeado, Anta Gorda, Teutônia, Vasco Bandeira e Santa Cruz do Sul. E, em todos, fez sua história e ganhou muitos títulos. “Minha vida no futebol foi inesperada, mas feliz. Sempre digo que só quem tem passado, tem histórias pra contar.”
O reconhecimento
Um dos fatos de que se recorda e o deixa muito feliz é a história do reconhecimento de um vizinho. Nos fundos da casa de Conzatti morava um senhor que ele chamava de “velho Weiller”. Esse homem, em 1976, o levava, ainda garoto, para assistir aos jogos do Lajeadense. Passaram-se alguns anos, e eles pararam de ir ao campo. “Um dia, minha mãe estava conversando com Weiller, e ele disse que, naquele domingo, voltaria para o estádio para olhar o jogo porque ele queria ver quem era o guri que tanto falavam no time, um tal de Itamar. Disse ele que queria ver se ele era tudo isso mesmo que estavam falando.” Mas mal sabia o senhor Weiller que o novo craque do time era o menino que ele levava para ver os jogos. A mãe de Itamar esclareceu que era seu filho.
Mágoa do futebol
Itamar conta que guarda uma mágoa no futebol e é do seu time do coração, o Lajeadense. Ele conta que, quando a equipe completou 100 anos, ele não foi convidado para a janta comemorativa do clube. “Talvez não tenha sido o jogador mais importante nesses anos, mas tenho certeza de que fiz parte da história e deixei uma marca muito bonita.”
Diz que não sabe se foi por esquecimento, mas lembra que até a imprensa contatou com ele para falar sobre a história do time, e o clube o esqueceu. “Não precisava nem me convidar, mas pelo menos me oferecer um cartão pra comprar.”
O que mais o marcou
Ele diz que nunca se esquecerá de um título que ganhou com o Bolamar, em Tramandaí. Já conquistou seis campeonatos, e um deles marcou sua história.
Conta que, em uma decisão contra a Espel, um dos times com mais rivalidade, estavam perdendo por 1 a 0, faltando três minutos para terminar a partida. “O treinador tinha me tirado para eu dar uma descansada, porque a areia cansa muito e, quando eu voltei para empatar, a Espel fez mais um gol. Demos tudo de nós e, nesse pouco tempo, conseguimos driblar e fazer dois gols.”
Emocionado, conta que foi incrível a superação. Foram para os pênaltis e ficaram campeões.
Fonte texto: Carine Krüger

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